A menopausa é vista por muitas mulheres como ou algo muito distante ou como um espectro à espreita pronto para trazer a chancela da velhice e da convivência compulsória com sintomas como fogachos, aumento de peso e perda da libido. Uma fase que pouco se comenta por conta das inúmeras inseguranças que surgem e da falta de informação. Mas será que é possível ter uma menopausa e uma pós-menopausa feliz? Algumas mulheres especialistas, cada uma dentro da sua área de conhecimento e visão de mundo, dizem que sim! Mas vamos entender antes o que está acontecendo.
Mesmo em meio a uma enxurrada de informações disponíveis no mundo moderno, a menopausa segue como um assunto ainda velado. Você pode dizer: “Mas isso já mudou bastante”. Sim. Mudou, mas não ainda o suficiente. Não se trata apenas de reconhecer que esse momento existe na vida das mulheres, e sim de entender sua dinâmica e seus sintomas, além de conhecer e ter disponível os tratamentos ideais para cada tipo de caso. Que são muitos.
Os fatores culturais são fortemente responsáveis por esse vácuo em que as mulheres que estão nessa fase da vida acabam entrando e ficando completamente perdidas sobre algo que está acontecendo com seu próprio corpo. A estrutura social patriarcal impactou – e impacta – diretamente a forma como a menopausa é negligenciada. Na ciência, os corpos femininos demoraram mais tempo para serem estudados, o que reflete na qualidade dos atendimentos médicos. Na sociedade, a mulher envelhecer é um tabu e o fim do seu período fértil visto como algo que coloca a mulher num lugar de “inutilidade”, gerando sentimentos de medo e rejeição.
Porém, há maneiras de viver o climatério, a menopausa e a pós-menopausa (que vai até o fim da vida da mulher), de maneira mais branda, quando o assunto são os sintomas físicos, e de maneira honrosa e até sagrada, quando se volta o olhar para o social, ajudando a transformar esse momento de transição da vida da mulher numa ferramenta propulsora para se atingir novas oitavas no desenvolvimento pessoal e espiritual, além da aceitação e da boa relação com o processo natural de envelhecimento.
Informação como a base da ‘menopausa feliz’
O tabu em torno da menopausa ”apaga” a principal aliada neste momento da vida da mulher: a informação. Sem ela, é comum ficar à mercê do senso comum, das complicações dos sintomas, das cobranças e críticas sociais e da falta de capacitação dos profissionais da saúde para atender as questões relacionadas a esse ciclo da vida.
Adriana Ferreira, de 57 anos, é fundadora da Associação Menopausa Feliz, que se propõe a conectar e auxiliar mulheres e pessoas com corpos femininos com identidade diversas através da informação sobre o climatério e a menopausa e da luta por políticas públicas para que esse período da vida da mulher seja devidamente acolhido e compreendido antes mesmo dele chegar. Ferreira, que tem três filhos e uma neta, hoje é uma mulher histerectomizada e que chegou a ser diagnosticada com 46 sintomas da menopausa.
Como o próprio nome da associação diz, a menopausa feliz pode ser uma realidade, mas Adriana lembra que, infelizmente, no momento, não para todas as mulheres.
“Nós temos que entender que a ciência evoluiu e já existe uma série de tratamentos diferenciados e para públicos diferenciados. Mas, infelizmente, nós não temos acesso a esse tipo de informação e tampouco a medicamentos para terapia de reposição hormonal. Nós não temos campanha pedagógica falando sobre o que é a menopausa, quais são os sintomas, as formas de tratamento, qual médico procurar, qual exame fazer e os impactos que essa fase traz para a vida da mulher. Dentro dos ciclos de vida da mulher, só a menopausa que não tem uma política pública específica. E é nesse período que nosso corpo está se preparando para o envelhecimento. Então se nós não tivermos uma ação preventiva, tratamentos disponibilizados pelo SUS (Sistema Único de Saúde), um acolhimento, um atendimento preventivo individualizado, automaticamente a mulher vai chegar na velhice com muitas doenças crônicas”, explica Adriana.
Esse cenário atual apresentado por Adriana não é um convite ao desânimo, pelo contrário. Adriana lembra que identificar o problema é o primeiro passo para a mudança, que ela e outras mulheres se propõem a fazer a partir da associação.
“E como ter uma menopausa feliz? A primeira coisa perpassa em você ter informação, mas informação de qualidade. Qualquer informação é essa questão cultural que a gente sabe: ‘Ah, menopausa é só calor’. Não, menopausa não é só calor. Há muitos outros sintomas. A segunda coisa, que é essencial, são as mudanças de hábito. Quando os hormônios começam a cessar, a ter alteração e até fim, o seu corpo vai responder de uma maneira diferente. Então será preciso mudar sua alimentação e inserir a prática de atividade física. A menopausa pode ser intensa, branda ou simplesmente bem fraca. E a informação é um fator importante que pode definir esse quadro.”
Quem também está na linha de frente para deixar o universo da menopausa mais leve através da informação que traz como proposta outra maneira de olhar para essa fase é a ginecologista Bel Saide, especializada em ginecologia natural, que traz um olhar holístico à saúde da mulher, abrangendo as questões físicas, mentais e espirituais das pacientes.
Saide destaca que, além das tão faladas questões físicas que tendem a amedrontar as mulheres, fatores sociais, ideológicos e políticos podem influenciar na qualidade de vida de quem está nesta fase da vida e isso precisa ser integrado na hora de acolher essa mulher e suas necessidades.
“A menopausa afeta o corpo e a psique. É um grande portal existencial que se abre e transforma muito as mulheres. É claramente uma nova fase de vida. Não nego, obviamente, as questões físicas e biológicas, mas percebo no consultório a forte questão cultural que atrela a menopausa ao envelhecimento, além de enfrentarem a somatização de todas as mudanças que elas estão passando naturalmente nesta fase da vida. A ginecologia natural vem para olhar essa mulher como um todol”, diz a ginecologista.
Bel afirma que sua linha de trabalho está voltada para o equilíbrio do corpo feminino através de tratamentos naturais, porém reconhece que a reposição hormonal pode ser recomendada para alguns casos, mas sua grande aposta está num caminho que ela chama de “mais verdadeiro”.
“A ginecologia natural sugere um outro caminho para tratar a mulher nesta fase. Um caminho mais verdadeiro que não fala de pílulas milagrosas e sim de um cuidado que a mulher precisa ter ainda mais atencioso para a sua saúde do que quando tinha com 20 anos. Nós somos uma geração de mulheres que vamos escrever uma nova história, porque as que vieram antes da gente realmente não tiveram essa oportunidade. Mas para isso é preciso olhar para o todo, não só como uma questão hormonal. E lembrar também que não se trata só de pensar na menopausa quando ela chegar, mas também ir se preparando para ela. A gente quer viver muito, né? Então, envelhecer, na verdade, é uma grande bênção, mas que isso aconteça da melhor maneira possível. E isso é possível através desse cuidado integrado. É lembrar que a mulher nesta fase pode tudo, ter saúde, qualidade de vida, bem-estar, tesão, disposição e beleza. A única coisa que ela não pode é engravidar espontaneamente”, destaca a ginecologista.
Menopausa: sabedoria e poder
A cosmovisão da sociedade ociedental não tende a ser muito acolhedora com as mulheres. Isso porque a história construída sobre bases patriarcais faz com que os papéis das mulheres sejam muito bem definidos e alocados em caixas de subserviência, procriação e jovialidade. Com a chegada da menopausa, esses três pontos podem ser vistos como uma subversão dessa estrutura, uma vez que as mulheres tendem a ficar mais independentes, não terem mais filhos e a envelhecer de forma mais nítida. O resultado é muitas vezes uma tentativa de apagamento dessa fase da mulher e uma oferta inveterada de produtos e serviços que prometam, no mínimo, frear essa transformação.
Porém, nem toda cultura é assim, e o que pode ser visto como fim e um tabu na sociedade moderna ocidental, pode ser honrado como o começo de um momento poderoso pessoal e espiritual na vida da mulher em outras cosmovisões, como é o caso da Tupi-Guarani e outras culturas de forte conexão com a terra e respeito aos seus ciclos estudadas pelo xamanismo.
Catarina Nimbopyrua é anciã da Aldeia Tapirema, do povo Tupi-Guarani, que fica em Peruíbe, litoral sul de São Paulo. Aos 75 anos, dona Catarina, como é conhecida, sabe da importância da chegada da menopausa, que é vista um marco de transição importante e potente na vida da mulher que impacta diretamente em sua estrutura física, mental e espiritual.
“Dentro da cultura Tupi-Guarani, depois da menopausa, a mulher desenvolve mais espiritualidade. Ela é considerada mais velha e mais sábia, que ganha o respeito das mais novas e o respeito de toda a aldeia. É o momento dela ensinar, porque tem mais experiência e espiritualidade. É algo bom, porque é natural, é da natureza, não podemos desrespeitar a natureza. Pessoas mais velhas ganham mais respeito, porque é uma fase de maior amadurecimento. Acreditamos que quando a mulher menstrua, seu corpo está mais aberto e a espiritualidade age de outra maneira. Então, quando ela para de menstruar, sua força espiritual aumenta”, conta dona Catarina.
Em relação aos desconfortos físicos que essa fase pode promover, a natureza, mais uma vez, é a fonte de cura para as mulheres Tupi-Guarani. “Tomamos muitos chás, como de amora, baleeira e picão, fazemos massagem com banha de caça do mato. Usamos o que a natureza nos dá e respeitamos essas mulheres. Isso melhora muito a nossa relação com a menopausa”, explica a anciã.
A psicóloga e xamanista Fany Carolina também traz uma visão de aceitação dos ciclos da natureza a partir do seus estudos das práticas xamânicas nas rodas de xamanismo feminino que promove. Entretanto, a psicóloga alerta que esse entendimento da menopausa como um processo natural não pode servir de argumento para normalizar a dor, o sofrimento e as doenças que possam surgir em decorrência desse período, muitas vezes, negligenciado por tantos motivos. Fany busca um caminho entre a aceitação e a não “patologização” desse momento da vida da mulher, fazendo da auto-observação uma grande ferramenta na hora que surgem os sintomas.
“Não tenho nada contra também a reposição hormonal, mas o problema é que as mulheres, logo no primeiro fogacho que elas sentem, já querem correr para a reposição, mas essa questão dos fogachos, por exemplo, tem toda uma representação simbólica também. Nessa transição para esse empoderamento que essa mulher está recebendo, ela passa a se aquecer por dentro, como um fogo interior da chama da vida nova que habita dentro dela, purificando e renovando, trazendo em ascensão essa nova sabedoria. Por isso é importante se observar neste momento, porque esse calor pode estar relacionado à alimentação, ao humor, à realização de exercícios físicos. E caso a mulher precise fazer a reposição hormonal, ela precisa procurar atendimento multidisciplinar, não só o de uma ginecologista”, diz Fany.
A xamanista também chama a atenção para os tabus sociais que levam as mulheres a não reconhecerem a potência da fase marcada pela menopausa. “O preconceito trabalha em cima da ideia de que menopausa é uma perda. Que a seria a perda da menstruação. Então, com a perda da menstruação, eu vou perder o vigor, a beleza, a sensualidade, a sexualidade, aí, o que mais posso perder? O emprego, o marido, os filhos? A mulher não perde nada, ela passa a, simbolicamente, guardar para transformar os ensinamentos em sabedoria e poder compartilhar. Nos passam essa ideia de perda a todo momento. Por isso, é importante se reunir com mulheres que estejam passando pela mesma fase e procurar trocar o chip de não só ficar falando de problema e sair da disputa para ver quem está pior e trocar saberes sobre essa fase, falar, se abrir e cada uma contar como está lidando e se ajudarem”, afirma a xamanista.
A dieta da mulher sábia
Falar sobre saúde sem citar a prática de exercícios físicos e uma alimentação saudável e equilibrada é algo um impossível diante de tanta literatura científica que mostra a importância dessas ações para o aumento do bem-estar e da qualidade de vida. Mas o que poucas mulheres sabem é que na fase do climatério, menopausa e pós-menopausa, a necessidade de se mexer de forma específica e se alimentar de forma correta ganha um novo grau de importância e necessidade. As estratégias nutricionais precisam ser traçadas de acordo com a fase da mulher e também de forma individualizada.
A nutricionista Thais Dias afirma que é importante ter uma dieta anti-inflamatória e que contribua para o equilíbrio hormonal. “A dieta Mediterrânea é a melhor opção para as mulheres que passaram pela menopausa porque é rica em grãos integrais, frutas, vegetais e proteína, que é algo indispensável e que muitas mulheres acabam criando aversão. Não pode faltar as frutinhas vermelhas e roxas. Os alimentos vermelhos contêm antioxidantes que ajudam a combater o envelhecimento das células na saúde cardiovascular. Uva, mirtilo, morango e pitaya também são opções. Vegetais escuros têm mais cálcio, ferro, ácido fólico e magnésio, que são muito importantes nesse ciclo. Indico também o uso das sementes de abóbora, girassol, linhaça, chia, gergelim, porque possuem fitoestrógenos, magnésio, fibras, que vão atuar em todo o metabolismo. Outro grande destaque são os chás como de cúrcuma e orégano, por exemplo, que têm ação anti-fúngica”, explica Dias.
O ganho de peso é um dos grandes desafios enfrentados na menopausa e isso pode fazer as mulheres a tomarem decisões alimentares que podem prejudicar o bom desenvolvimento do organismo. É o caso do corte de gorduras e carboidratos.
“Gorduras e carboidratos são bem-vindos, a gente só vai selecionar a fonte. É importante consumir gordura boa, como a contida no abacate, no azeite e nas castanhas. Já os carboidratos indicados são aqueles presentes nos alimentos integrais, mas também de forma equilibrada para que haja um controle da carga glicêmica”, diz.
Quando o assunto é exercícios físicos, aquela caminhada ou corridinha podem ajudar, mas o importante é cuidar da saúde dos músculos, que vai perdendo força na fase da menopausa por conta da queda hormonal. Portanto, fazer musculação é uma das dicas importantes deixadas pelas especialistas.
A nutricionista lembra que tudo isso precisa ser feito a partir de um olhar multidisciplinar e com profissionais que realmente tenham conhecimento sobre o assunto.
“Infelizmente há muitos profissionais despreparados, então a gente acaba escutando muito: ‘Ah, é assim mesmo, isso é normal, isso é coisa da idade’. Não devemos encarar como algo normal nenhum dos sintomas da menopausa, porque todos eles têm tratamento, então a nossa visão tem que ser positiva, buscarmos informações confiáveis, orientação de profissionais capacitados, porque esse direcionamento faz toda a diferença. É uma fase onde nós estamos muito sensíveis sofrendo com esses sintomas alterações hormonais que vão trazer mudanças físicas, mentais e emocionais. É uma fase bastante desafiadora, mas com muita informação e direcionamento correto é possível enxergar que é uma fase natural da vida de toda mulher. Não é o fim da vida, pelo contrário”, diz Thais.
Caroline Apple
Jornalista, palestrante, colunista e influenciadora digital especializada na produção e gestão de conteúdo digital e reportagens em diversas editorias, principalmente Direitos Humanos, políticas de drogas e causa indígena.
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Parabéns e obrigada pela matéria incrível. Eu sempre digo que o porão do inferno da menopausa é um lugar que nem o diabo visita. Mas, Deus está lá. Tenho 51 anos e fui à esse porão… A melhor decisão que tomei foi nunca mais desistir de mim. Com estilo de vida e reprogramação mental eu me libertei dos 75 sintomas que tive, alcoolismo, depressão com ideação suicida e eliminei 44 kg. A menopausa foi o melhor presente da minha vida, o meu despertar. Hoje vivo o meu extraordinário. Como escritora estou finalizando meu próximo título: Menopausa como curei minha alma. Fico esperançosa quando vejo informação de qualidade sendo compartillhada assim. Mais uma vez, gratidão!